A Visão
O chão treme, sinal de que a Terra está a sangrar.
Duas noites sem dormir, quatro dias sem comer Digo as orações à Mulher-que-vive-no-Céu, bebo a última gota do orvalho da Lua Cheia, surge então uma névoa no meu olhar e começa a Visão:
O pássaro-espírito espera por mim para me conduzir ao meu protector, Vento-que-anda. Ele avisa-me dos tempos em que vivo e de como eu preciso de mudar para que o mundo também mude, como preciso de fazer crescer em mim a Sabedoria dos Antigos, conhecer a linguagem da Terra, ser Um como os meus irmãos (afinal somos uma só Alma).
Antes de ter tempo para falar com o meu protector a Visão acaba. Ouço e sinto o Vento, o seu sinal de adeus. Fico só, sei que caminho seguir (sempre soube), algo me faz hesitar, tremo, racionalizo, invento desculpas e esqueço tudo. Recuo no meu caminho, encho-me de superficialidade e o Vazio em mim cresce.
Meses e anos, esta falsa vida pode permanecer, e passa a ser algo que sei e cobardemente nego. Até ao dia em que já consigo mais viver dentro de uma pele que não é minha, o mesmo dia em que a arranco e grito o meu verdadeiro nome alto.
Entrego o meu nome de novo desta vez ao Vento, ele que o leve aos quatro cantos da Terra, para que assim voe a mensagem que não fugirei mais dos passos que devo dar (os passos que validarão toda a minha existência).
Começo a andar ainda meio tremido, com a dignidade de um guerreiro que tem medo mas não se deixa derrotar, e sigo o meu Caminho com o passaro-espírito ao meu lado.
texto: Jorge Amorim