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Sonhos Urbanos

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Domingo Sangrento

por Jorge, em 19.02.06
Acordar ao som de martelada, estranhamente apelidada de música, é uma experiência que acorda o nosso lado mais selvagem. Foi este evento que me fez tomar uma decisão: assassinar cruelmente o meu vizinho. O puto é mais novo que eu, deve andar numa fase de “sou um rebelde que podia viver nos Morangos com Açúcar”, ronda o excesso de antipatia e ouve música má em altos berros (a qualquer hora).

Dirigi-me ao WC, lavei a cara, olhei para o espelho e sorri sadicamente.
Elegi o material necessário para levar a cabo o frio homicídio, na verdade, inspirei-me no estojo de trabalho do Professor Egas Moniz.
Vesti uma roupa apropriada, em tons escuros para não se notar as nódoas de sangue e lá saí de casa para lhe fazer a simpática visita.



Bati à porta dele, veio a mãe à porta com um sorriso, perguntou como estava a minha família, a namorada, o cão, o gato… Enfim, respondi que estava tudo bem (se bem que “tudo bem” não existe, como diria um amigo meu). Perguntei-lhe pelo seu “doce” rebento ao que a senhora me disse:
- Está a ver a transladação da Irmã Lúcia na televisão, ele emociona-se muito com estas coisas.

Só então percebi o horror, aquilo não era um adolescente… era na verdade uma perigosa criatura, vinda de um qualquer canto escondido de uma galáxia misteriosa (com fortes probabilidades em estar perto de um comedor-de-carne-humana cósmico).

Sem mais conversa, empurrei a senhora e avancei casa adentro:
- Afaste-se, esta criatura não é o seu filho. Não se preocupe que eu trato do mostrengo que cá reside.

Lá estava ele na sala, a sua pele translúcida espelhava o directo apresentado na televisão. Viu e sibilou umas palavras viscosas (acho que foi “Olá, Jorge! Estás bom?”, agora também não interessa).

Peguei na serra n.º 3 e fiz aquilo que qualquer bom cidadão teria feito, o som de fundo eram os gritos histéricos da minha vizinha, a cor dominante era o sangue esverdeado que jorrou nos 15 cortes profundos que realizei.

A polícia invadiu a casa, uma hora depois, mas compreendeu a situação e agradeceu-me profundamente.Revistaram o quarto do jovem e descobriram os planos de conquista mundial, escritos numas quaisquer folhas de papel higiénico.

Debaixo da cama estava o verdadeiro adolescente, viciado em “Morangos com Açúcar” (uma geração amaldiçoada pela falta de bom gosto). Desamarrei-o e ele com maus modos chamou-me de “maricas”, aquele sim era o rapaz que eu aprendera a odiar devido à sua berrante música. Dei-lhe um abraço, seguido de um pontapé nos tomates e um aviso:
- A partir de hoje ouves a música baixinha ou volto para te apresentar a serra n.º 4!

A mãe agradeceu-me e colocou 10 € na minha mão, “para beberes um café”.

Voltei a casa e actualizei os meus blogs.

E, pronto, foi mais um Domingo na vida de um blogger (e podcaster).

Texto: Jorge

Ilustração: Joe Pekar

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