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Sonhos Urbanos

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(Re)Encontro (Parte II)

por Jorge, em 01.07.05
Espero por ti durante meia hora. Estou inquieta com a ideia de te ver novamente. Tenho tempo de sobra para me arrepender. E arrependo-me. E mesmo assim não me decido a ir embora. Mato o tempo a olhar pela janela, estendida na cama e a atravessar o quarto sem destino. Até que finalmente são onze e meia e alguém bate à porta. Apresso-me a abrir porque sei que és tu do outro lado. Ficamos o que parece ser uma eternidade a olhar um para o outro sem pronunciar uma palavra. Então, tu quebras o silêncio e dizes que eu estou linda e que parece não ter passado um único dia. Eu lembro-te (com uma ponta de ressentimento) que passaram quinze anos. Tu finges que não ouves e prendes-me nos teus braços e eu aceito que não há cobranças e digo que tinha saudades dos teus abraços e de me sentir em casa. Finalmente fecho a porta e sento-me na cama para te ouvir. Tu sentas-te ao meu lado e seguras as minhas mãos entre as tuas...

Dizes-me que cometeste um grande erro, e que possivelmente o Universo vai pagar com esse engano. Talvez seja o fim de tudo como sempre o conhecemos! Não te ocorreu solucioná-lo porque há coisas que estão condenadas e temos inevitavelmente de deixar morrer. Tiveste que me telefonar porque nos últimos dias só pensavas nos meus olhos e em tê-los mais uma vez antes do fim...

[Sempre foste tão misterioso, com esse ar megalómano de homem que acredita ter substituído Deus... Como um pedaço de areia que inevitavelmente me escapa entre os dedos, por muito que me esforce para o agarrar... Claro que nunca podemos ficar juntos, há seres que se querem livres ou mortos, porque enclausurados nunca poderiam sobreviver... Eu deixei-te seguir o teu caminho porque acredito que abdicar também é um acto de amor...]

Quando desperto dos meus pensamentos estás inclinado para me beijar! Não penso sequer em repelir-te porque sei que, apesar de tudo, tu és o homem da minha vida, e o homem da minha vida não precisa de autorização para ter acesso a mim. Porque no princípio fomos um, o facto de me tocares é como estares a tocar-te a ti próprio...

E então beijamo-nos!... E perdemo-nos!... E encontramo-nos!... E quando voltamos de novo ao mundo percebemos que ele não parou de girar e que está tudo em chamas, tal como visionariamente tinhas previsto no início. E porque não nos ocorre fazer nada para impedir o inevitável, aceitamos os gritos de desespero e contemplamos, maravilhados, aquela imensidão de labaredas vermelhas que avançam vorazes sobre nós, transformando à sua passagem tudo em cinzas. Assim permanecemos, sem ousar um gesto, a observar tudo da janela de um quarto de hotel. Juntos num último momento de egoísmo, que grita que somos humanos, mesmo antes do fim...

Texto: Raposa

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