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Sonhos Urbanos

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O fuzilamento

por Jorge, em 18.12.12

Uma parede crua e fria, num dia de luz branca e temperatura perto dos 8º C, foi o cenário que escolhi.

 

Dei a primeira ordem em voz alta e nada aconteceu. Aguardei uns bons trinta segundos e, desta vez, berrei com todo o ar dos meus pulmões. Começaram a entrar as pessoas... Tão diferentes entre si. Traziam despertadores, tablets, portáteis, telemóveis, televisões, fotografias de pessoas, horários escolares, mensagens de natal de presidentes da republica portuguesa, programas de eleições, entre outros artefactos. Cada uma tinha escolhido aquilo que a consumia (ou o símbolo desse consumo) e enconstou à parede crua e fria.

 

 

Afastaram-se, pegaram em armas de fogo e, sem qualquer acordo, dispararam em unissono. Pelo fogo consumiram aqueles artefactos. Depois, terceiros vieram recolher os restos e fez-se o enterro sem grande festejo. Não foi um momento puramente emocional, foi uma decisão que recrutou a razão, trazia dor mas foi uma vitória da liberdade de escolha.

 

Ainda nesse dia o desafio foi não escolher um novo objecto para o consumir... 

A rapariga que pensava que era cobarde

por Jorge, em 26.10.12

[acompanhar com este som - The National, "Runaway"]

 

Ela era fria e cobarde, até tinha o cuidado de avisar as pessoas. Fugia de tudo o que tivesse a ver com o Amor. Rosnava palavras de ordem ao mundo, escondia o sorriso, camuflava o brilho nos olhos e até fingia esquecer as palavras que precisava de gritar ao mundo.

 

Disse-me que preferia brincar sozinha, muito mais seguro. Disse-me que nem se interessava por nada ou que não tinha nada para partilhar. Mentia com todos os dentes.

 

["We don't bleed when we don't fight"]

 

Passeava com a sua bolha social e impedia as pessoas de se afastarem e acreditem que todo o universo ficava a perder com isto...

 

 

 

E eu aqui fiquei afastado a ver e a torcer para que um dia mostrasse a todos tudo o que tinha de bom, que é uma sonhadora sem limites capaz de fazer tudo o que se propor a fazer.

 

["Throw your arms in the air tonight

We don't bleed when we don't fight
Go ahead, go ahead
Lose our shirts in the fire tonight"]

Keep it simple

por Jorge, em 08.10.10

"entia non sunt multiplicanda praeter necessitatem"

 

 

Decidimos passear ao lado um do outro, sem compromisso maior, mãos dadas e os anos passaram.

Quantos foram?

Sei que não aguentávamos mais aquela rotina e planeámos fugir numa noite de lua cheia.

Com a chegada da tal lua que vinha cheia, roubámos um balão de ar quente do vizinho do lado e fomos até às estrelas.

Um dia seremos capas de revistas e entrevistados por todas as televisões, para nos perguntarem qual o nosso grande segredo.

Talvez vos diga agora, o nosso grande segredo é...

 

 

(acabou-se a tinta no computador)

Vive na minha cave, arrasta-se por ali sem nome...

por Jorge, em 27.09.10

Nem todos os extraterrestres são simpáticos e nos levam a passear por distantes galáxias.

É certo e sabido que alguns andam equipados com sondas anais e muito brincam com isso.

Outros raptam gado para vender como sushi em planetas menos informados.

 

 

 

 

A criatura verde apareceu sem qualquer aviso, falava fluentemente português e deixou-se ficar na minha cave.

Não me interessa se conspira sentada num sofá ou pendurada de cabeça para baixo.

Não me interessa se quer dominar o planeta ou assaltar um banco.

Interessa-me que pague a renda.

Uma semente de medo

por Jorge, em 17.09.10

 

Todas as noites sem estrelas, um Deus nocturno desce sobre a Cidade dos Corvos. Ele é o criador de medos; aproveita a ausência de Luz para depositar uma semente de medo, na mente sonhadora de cada um dos cidadãos da cidade.

 

Ao acordar, tu e eu, fazemos germinar a semente do medo e passamos a carregar um medo pequenino connosco. Muitas vezes é só uma vozinha difusa que nos faz dizer "não" quando precisamos de dizer "sim". Quando cedemos a este medo, ele cresce e a partir daí quem o fez fica responsável por ele.

 

Desenvolvem-se medos muito muito poderosos, porque todos temos a força de os desenvolver. Quando não cedemos ao medo, o criador dos medos volta a colocar uma semente de medo, apenas com o objectivo de desenvolvermos uma coragem poderosíssima e continuarmos a ter novos desafios para superar.

 

Por isso temos milénios e milénios de sabedoria para vencer os medos e irmos mais longe.

Manifesto Anti-Foca

por Jorge, em 16.09.10

BASTA!

 

UMA GERAÇÃO, QUE CONSENTE DEIXAR-SE REPRESENTAR POR UMA FOCA É UMA GERAÇÃO QUE NUNCA O FOI! É UMA RALÉ DA PIOR ESPÉCIE! É UMA RÊSMA DE MACAQUINHOS ESCANIFOBÉTICOS, E SÓ PODE PARIR ABAIXO DE ZERO!

ABAIXO A GERAÇÃO!

 

Põe-te na alheta, oh Foca, na alheta já!

A Foca é meretriz

A Foca é Feliz

A Foca tem pêlos no nariz

 

A Foca é animal

A Foca é meio-animal

A Foca veste-se mal

A Foca subiu na horizontal

 

 

E AINDA HÁ QUEM LHE ESTENDA A MÃO!
E QUEM LHE LAVE A ROUPA!
E QUEM TENHA DÓ DA FOCA!

 

Se a Foca é Lisboeta, eu quero ser de Odivelas.

 

É para isto que pagamos impostos?? É para isto que só nos reformamos lá para os 70?

Para a Foca andar de BMW, ando eu de Metro.

Para a Foca ter reforma ando eu a trabalhar.

 

Põe-te na alheta, oh Foca, na alheta já!

 

Texto: Jorge Amorim e Almada-Negreiros

Fotografia: Nuno Silva

O ROUBO DO GALO (reciclado do Palavras Contadas)

por Jorge, em 06.09.10

O som imaginado de dentes metálicos povoava a mente assustadiça do Galo. Do fundo das suas penas, sabia que uma ameaça-arquétipo estava para surgir na sua vida. Aflição vincada nos seus dias. Desejava viver para sempre, a morte não era convidada para os seus pensamentos.

 

Investiu grande parte da sua fortuna pessoal a equipar a sua capoeira, algo fortemente criticado pela gorda galinha branca (quem realmente mandava na zona). Todas as noites eram as mesmas invasões do seu mundo onírico, o cheiro a morte, a promessa de uma dor aguda e fria e o vazio de deixar de existir. Os alarmes de segurança e as grades electrificadas pouca segurança lhe deram.

 

Numa noite fria de Outono, o seu medo tomou forma. Acordou com uma matreira Raposa castanha perto de si. Um pesadelo de carne e ossos, do qual não conseguimos acordar... sensação asfixiante. A respiração ficou difícil, o som do coração converteu-se num tambor... Que triste fim era aquele.

 

- Calma! - Disse a Raposa – vim só conversar. Tens chá?

- Camomila serve? - Sussurrou o Galo ainda aterrorizado

- Claro sossega-me e é bom para ajudar na digestão - sorriso sacana - Sabes que a nossa história é um cliché?

 

O Galo começou a preparar o chá, aproveitando cada instante para sondar a sua capoeira em busca de alguma coisa que pudesse usar como arma contra a Raposa.

- Qual história? . perguntou apenas para ganhar tempo.

-A do roubo do Galo... Uma raposa matreira invade uma capoeira para roubar o galo, mais tarde na sua toca, transforma-o numa suculenta comezaina. Eras e Eras com a mesma história a arrastar-se pelo Tempo e pelo Espaço. Talvez tenha chegado à altura de pensarmos neste encontro de uma forma diferente

- O que queres? - Por esta altura as penas do Galo estavam ensopadas com um suor frio. Por um bocado, a raposa apenas sorriu.

- Vim dar-te em algo para pensares, vamos abandonar a rotina - Dito isto, a Raposa pegou numa pistola e deu um tiro na sua própria cabeça.

 

O Galo, em choque, urinou-se penas e patas abaixo e desatou a soluçar.

 

Texto: Jorge

Barras

por Jorge, em 14.07.10

Não sei quanto tempo ficarei aqui, mas através destas barras eu vejo esperança.

Mesmo que tenha alimento e abrigo, não tenho a liberdade e a incerteza.

Se continuar assim, só estou à espera do dia em que morra.

 

O que vou fazer? Fico na mesma? Saio?

 

Ou aproveito e comunico com os visitantes do Zoo? "Então pá, tudo bem?", "Tudo", "E a família?" ... Aposto que lá fora têm conversas interessantes mas nós, os encarcerados, temos vista curta para diálogos criativos.

 

 

E se sair desta jaula o que vou fazer?

 

"I don't like jail; they got the wrong kind of bars in there."

Charles Bukowski

 

Fotografia: Nuno Silva

Texto: Jorge

Dados

por Jorge, em 17.02.10

Um par de dados (com vinte faces) lançados, vista de olhos pelo resultado, decisão tomada... No dia seguinte, o mesmo método usado, o lançar de um par de dados. Método utilizado nas últimas voltas que a Terra deu ao Sol.

 

Julgo que ele espera um dado resultado ao lançar os dados para tomar uma decisão (há muito já tomada na sua cabeça). Pergunto-me é o porquê dos dados...

 

Ao perguntar esta questão, olhei para o conteúdo do meu bolso e encontrei um par de dados. Meio envergonhado tentei escondê-los. Ninguém os viu. Suspirei, olhei para as nuvens no céu e dei-me por contente por estes só terem 6 faces. Que sortudo, mais provável de sair resultado favorável.

Maldito candeeiro

por Jorge, em 22.12.09